Opinião

Novos rumos e competitividade nos leilões de 2019

Os resultados obtidos no leilão A-4 e as expectativas para o leilão A-6 refletem a aposta em liberalização e abertura de mercado

Por Rachel Andalaft

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Com as reduzidas projeções para o crescimento do PIB em 2019, a baixa demanda por parte das distribuidoras no Leilão A-4 já era esperada. Sem um sinal concreto de que os investimentos no país serão desengavetados, o mercado de energia se forma em torno de muitos ofertantes e, consequentemente, preços baixos.

Além da agenda política ou até mesmo da posição mais conservadora do Banco Central em relação aos juros, cabe olhar para os bastidores do setor para entender uma série de iniciativas que prometem impulsionar o crescimento do mercado livre e a dinâmica dos leilões.

GSF

A solução para o impasse do GSF foi aprovada por meio do PL 10.985.  Aprimoramentos para reduzir os riscos das geradoras foram incluídos, tamanha a importância de se criar condições mínimas de operação em um mercado que ficou disfuncional por conta de uma inadimplência de R$ 7 bilhões.  O PL 10.985 será agora testado na prática por meio das negociações com as geradoras.

Liminares obtidas pelas geradoras, que impediam o pagamento da energia vendida e não produzida, serão substituídas pela extensão dos contratos de concessão. Isso por si só vai reduzir os temores dos vários investidores que observavam o amadurecimento dos temas debatidos pelos agentes do setor, mas tinham enormes ressalvas em relação aos custos desse empecilho bilionário.

A regulamentação da Aneel é que vai definir a forma como essa pendência será digerida pelo mercado, indicando o prazo adicional para cada concessão e o cálculo do pagamento por parte dos geradores.

Deste modo, a resposta para o problema do GSF mostrou uma mudança de postura.  Deixou-se para trás a ideia de que os prejuízos deveriam ser divididos entre todos e uma visão mais pragmática de solução de mercado predominou nas conversas.

Debêntures de Infraestrutura

O setor de energia é um dos mais ativos no uso das debêntures de infraestrutura.  Concebidos como instrumentos para a captação de recursos para projetos considerados prioritários pelo governo, tinham a sua limitação no descasamento entre a visão mais imediatista dos investidores pessoa física, agraciados com a isenção de imposto de renda, e o longo prazo dos projetos dessa natureza.

Agora, uma iniciativa do Ministério da Economia pode deslanchar as emissões dessas debêntures, atraindo investidores institucionais e estrangeiros. Ao permitir a emissão de uma categoria adicional, não destinada à pessoa física, a empresa pode oferecer um retorno maior para os investidores verdadeiramente de longo prazo.

Apenas no mercado local, R$ 1 trilhão de recursos de fundos de pensão e um valor aproximado entre R$ 2 trilhões e R$ 3 trilhões nas mãos de investidores institucionais precisam de melhores retornos para remunerar o dinheiro de pessoas comuns. Especificamente no caso dos fundos de investimento, melhorias estão sendo feitas para acomodar a realidade. Mundialmente, estima-se que investidores internacionais alocarão mais de US$ 210 bilhões em projetos de energia renovável até 2024.

No Brasil, com a ausência de bons papéis privados no mercado, os fundos de debêntures incentivadas deixam de captar recursos para não perderem a isenção fiscal. Visto que possuem o prazo de 2 anos para formar uma carteira 85% alocada nesses papéis, ficam de mãos atadas quando há uma escassez de bons projetos em busca de financiamento.

Já para atrair o investidor estrangeiro, a eliminação do imposto de renda e um ambiente mais estável para o real, decorrente da aprovação das reformas propostas, vão minimizar preocupações  sobre risco cambial, comum em projetos com funding em moeda estrangeira, mas com receita  em moeda local.

As empresas emissoras também foram beneficiadas, com prazo para pagar despesas via captação de debênture alongado de 2 para 5 anos. Mais um ajuste favorável à estruturação financeira junto a investidores estrangeiros que terão condições melhores para emitir os títulos ou mudar o perfil de seu endividamento, optando por operações mais baratas como capital próprio da categoria BOO (build, own and operate).

Abertura de capital

A maior oferta pública inicial de ações do ano é de uma empresa de energia.  A Neoenergia levantou, no início de julho, R$ 3,26 bilhões. O IPO foi bem sucedido e indica uma mudança no mercado de capitais expectativas em torno de um governo pró-mercado e a repercussão no segmento de fusões e aquisições.

Análises do mercado indicam que o ano de 2019 já começou bastante dinâmico. As operações não envolvem apenas os tradicionais players do setor, mas incluem também agentes que querem acesso a projetos e contratos lastreados por energias renováveis.  Mais do que um reforço na imagem institucional, a motivação é puramente financeira: a eficiência nos custos. Combinada à maior liberalização do mercado livre, essa tendência segue padrões dos mercados internacionais com maior foco em contratos privados de venda de energia (PPAs).

Mesmo que em outubro, no leilão A-6, a demanda seja menor, isso não diminuirá o interesse das geradoras.  Particularmente no caso das fontes renováveis, uma das estratégias é vender no leilão apenas uma parte da energia do empreendimento, suficiente para assegurar a conexão à rede de transmissão.  O restante é reservado para ser ofertado no mercado livre. E, haja vista a demanda por estrutura de transmissão no país, o acesso à conexão vale ouro. Em meio a essas tendências, observa-se a consolidação de uma mentalidade de negócio pronta para dar novos rumos ao setor no país.

* Rachel Andalaft é sócia-fundadora da REA Consult e gestora junto a investidores institucionais

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