Opinião

Combustível do Futuro e a mudança no comando da Petrobras

Projeto de Lei traz regulamentações importantes para o mercado de combustíveis do país, mas gera conflitos que precisam ser mediados

Por Osmani Pontes

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O projeto de lei “Combustível do Futuro” encaminhado pelo Executivo e que tramita no Congresso Nacional é o principal pilar da política de transição energética do Brasil e se pauta no ponto correto que é a regulamentação do mercado que se deseja desenvolver.

No entanto, ao incentivar uma nova demanda abre simultaneamente uma disputa por fatias de mercado entre o agronegócio e os produtores de gás. Esse embate é um dos pontos nevrálgicos da tensão entre o Ministério de Minas e Energia e a gestão da Petrobras, que culminou na troca de CEO da estatal. O processo foi fruto de um choque entre o MME, mais sensível a reivindicações dos produtores do agro, e a Petrobras, preocupada com a defesa de mercado para seus produtos.

Há propostas para oferta estimulada a cinco produtos: biometano, SAF, HVO, etanol e biodiesel.

Para o biometano, haverá exigência para produtores e importadores de gás natural comprovarem o uso de quantidade mínima do biometano no total de gás consumido. A parcela mínima começará em 1% em 2026 e chegará a 10% em 2034. O biometano é obtido pela depuração de biogás e é um substituto perfeito para o gás natural sem alteração de equipamentos de queima. A produção nacional hoje é de 1 milhão de m³/dia e pode chegar a 7 m³/dia em 2029 passando de 6 para 9 usinas, segundo dados da Associação Brasileira de Biogás.

Os combustíveis sustentáveis para aviação, SAF na sigla em inglês, são produzidos a partir de óleos vegetais e etanol e o projeto define que após 2027 as companhias aéreas terão de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 1% ao ano chegando a 10% em 2037.

Para o diesel verde, HVO, o plano define que até 2037 haverá um mínimo utilizado na composição do diesel comercializado no mercado interno em percentual ainda a ser definido.

O etanol por sua vez terá sua parcela aumentada na gasolina de 22% para 35% de etanol anidro, sendo que o teto hoje é de 27,5%.

Já o biodiesel adicionado ao diesel aumentará a parcela em 1 ponto percentual até 2030 quando chegará a 20% e 25% no ano seguinte. Haverá ainda compensações tributárias para usinas que produzirem combustíveis a partir de fontes agrícolas renováveis oriundas de milho, soja e cana-de-açucar. A redução de gases de efeito estufa pode chegar a até 90% e seria possível explorar a segunda maior produção de biodiesel do mundo.

A maioria das propostas teria prática fiscalizada pelo Conselho Nacional de Política Energética e trazem ainda a vantagem de serem combustíveis obtidos a partir de tecnologias drop-in, ou seja, que não exigem adaptações nas plantas de produção, ensejando baixos custos de transição.

No entanto, a lei traz em seu bojo um conflito de interesses subjacentes à ótica da economia política que opõe o agronegócio e os produtores de gás natural, entre eles a Petrobras. Isso porque o diesel é o principal produto vendido pela empresa, respondendo, juntamente com a gasolina, por 74% das receitas da petroleira. O efeito sobre a rentabilidade gerado pelo PL é da ordem de R$ 22,4 bilhões, considerando o aumento da participação de biodiesel na produção de diesel. Há ainda um problema contratual, já que no setor de óleo e gás os contratos que regem todas as empresas têm duração média de 10 anos, de maneira que uma transição como a exigida pela lei pode gerar um custo anual de R$ 570 milhões já que não é possível mudar o preço de venda para incluir as novas moléculas.

Diante desse quadro, a Petrobras tentou incluir o R5, diesel com 5% de renovável em que ela é a única produtora, na parcela de diesel vegetal definida na lei, o que gerou reação da bancada do agro no Congresso, ao ver na regulamentação boas oportunidades de retorno. Um segundo movimento então foi incluir o R5 na parcela reservada ao HVO, já que não há produção no país de diesel verde. Porém, nesse caso o entendimento dos produtores do agro é de que isso criaria reserva de mercado para a Petrobras, inviabilizando o desenvolvimento da produção no país, uma espécie de barreira à entrada.

A discussão sobre a regulamentação não pode prescindir dos conflitos de interesse que precisam ser atendidos para não haver prejuízo econômico de nenhum setor, mas é da ordem do dia concessões por meio da mediação, que é o que se espera do Poder Executivo, já que a pauta não pode esperar. Trata-se de uma corrida contra o tempo.

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