Opinião

Cogeração de energia precisa ter reconhecimento de seus atributos

Estimativa é de expansão de 800 MW a 1 GW em 2024; biogás aponta potencial de crescimento e usinas esperam pela liberação para comercializar excedentes à garantia física no mercado livre

Por Newton Duarte

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O ano de 2024 começa com perspectivas positivas para a cogeração de energia. A expectativa, com base em dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), é que a expansão da capacidade instalada possa chegar de 800 MW a 1GW, o que poderia representar uma adição de aproximadamente 3,8% a 4,8% em relação aos 20,6 GW atuais de capacidade instalada em operação comercial no Brasil.

É uma estimativa promissora, depois de um incremento tímido em 2023 – de apenas 217,7 MW. É verdade que, para a maioria dos associados da Cogen, o ano passado foi atípico.

Do ponto de vista setorial, o mercado de energia se viu diante de um panorama de fartura na oferta de energia das chamadas novas renováveis e sobrecontratação de parte das concessionárias de energia elétrica.

Por outro lado, a cogeração movida a biomassas de cana-de-açúcar registrou uma trajetória de recuperação da energia exportada para o Sistema Interligado Nacional (SIN), graças à retomada dos níveis anteriores de produção depois de dois anos particularmente difíceis, por conta de fenômenos de ordem climática e ocorrências que castigaram os campos: um severo período de seca, fortes geadas e incêndios de graves dimensões.

Na safra 2023/2024, as usinas esperam recordes de esmagamento de cana-de-açúcar, o que propicia vasta quantidade de biomassa e, consequentemente, uma cogeração de energia apta a exportar muita energia para o grid.

Isso é relevante porque não é de hoje que a cogeração de energia vem dando uma significativa contribuição para a segurança energética do País. Desde que essa indústria começou a despontar, com crescimento expressivo na primeira década dos anos 2000, a cogeração tem sido fundamental para uma matriz elétrica mais equilibrada, inclusive poupando água dos reservatórios das hidrelétricas em períodos secos – número que chegou 14 pontos percentuais de poupança do nível dos reservatórios das hidrelétricas do subsistema Sudeste/Centro-Oeste, região onde justamente está o principal mercado consumidor do País.

Detalhe: as usinas de açúcar e etanol entregam essa energia principalmente no período de safra, o que em grande parte coincide com o período seco nessas regiões.

E essa relevância merece ser mais bem reconhecida. A cogeração tem atributos que contribuem significativamente para o vigor do sistema elétrico brasileiro. É uma energia firme, com qualidade e não intermitente. É distribuída, gerada em usinas próximas dos pontos de consumo, o que dispensa a necessidade de investimentos em longas linhas de transmissão (caminho preocupante que o País tem tomado, como mostra fatos recentes).

As usinas de cogeração têm diversas externalidades econômicas e ambientais. A cogeração a gás natural, por exemplo, poderia ter um custo mais competitivo, em comparação com o custo de usinas termelétricas, levando-se em conta sua maior eficiência.

A expectativa da Cogen é que o potencial da cogeração de energia possa ser mais bem reconhecido no planejamento energético brasileiro, com uma sinalização mais assertiva de expansão, estimulando decisões de investimento.

E o potencial de crescimento é expressivo, considerando a nova fronteira aberta com a consolidação do biogás derivado da vinhaça, palha e torta de filtro, por exemplo. A produção de energia via biogás já é uma realidade, e vem sendo vista com interesse cada vez maior pelas usinas de açúcar e etanol, dada a multiplicidade de usos e aplicações, da produção de energia ao uso como combustível na forma de biometano. Muitos dos grandes grupos de usinas estão se movimentando nessa direção, com investimentos e parcerias. E a cogeração certamente deve aumentar sua contribuição para o SIN.

Em 2024, além dos reconhecimentos dos atributos de fonte, vamos reforçar um pleito do setor de cogeração que consideramos pertinentes e de fácil adoção: uma medida infralegal do Ministério de Minas e Energia. Entendemos que as usinas poderiam ter maior liberdade para negociar os excedentes da cogeração também no mercado livre, uma vez que essa indústria já comercializa quase 70% da sua energia neste mercado.

Portanto, é preciso criar uma solução para que cada usina possa vender o excedente de sua produção no mercado livre. Nossa proposta é um ajuste na portaria 564 de 2014, que hoje limita a venda no mercado livre até a garantia física, obrigando as usinas a liquidar os excedentes no Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), o que não remunera nem mesmo o bagaço de cana-de-açúcar, além de ter enfrentado anos de inadimplência devido à judicialização dos geradores. Isso representa um entrave para novos investimentos.

Por fim, uma mensagem: o Brasil se destaca pela multiplicidade de fontes energéticas. É preciso que todas que apresentem atributos positivos sejam valorizadas, assegurando um pleno equilíbrio dos sistemas elétrico e energético do País.

Newton Duarte é presidente executivo da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen)

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