Opinião

Armazenamento de energia gravitacional: um novo horizonte

A inclusão de diferentes tecnologias de armazenamento nos leilões de energia seria um passo fundamental para modernizar a matriz energética brasileira, tornando-a mais competitiva, em favor dos consumidores. Confira a opinião de Wagner Victer.

Por Wagner Victer

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Recentemente, o Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em entrevista, sinalizou que os sistemas de armazenamento de energia poderiam ser considerados em futuros leilões, incluindo o LRCAP 2024. O tema já havia sido abordado na Consulta Pública nº 160, lançada pela Aneel no final de 2023 e destacado em palestras e eventos dos quais participei e artigos. Quanto à regulação destes sistemas, em especial, sugiro a leitura de artigo publicado pela FGV Energia, que detalha desafios e oportunidades de 2024 a 2027. 

Quando se fala em armazenamento de energia, normalmente pensamos em baterias químicas, sobretudo as de íons de lítio. No entanto, com a crescente demanda mundial por armazenamento de energia, outras tecnologias disruptivas, baseadas em princípios básicos da Física, começam a amadurecer. Por exemplo: a energia potencial gravitacional, uma forma reconhecida de armazenamento de energia que pode ser canalizada por diferentes meios.

As hidrelétricas reversíveis, que também estão na agenda regulatória da Aneel, utilizam esse conceito. Além disso, existem exemplos de acumulação de energia potencial em blocos que são elevados e posteriormente transformados em energia cinética para gerar eletricidade.

O sistema interligado brasileiro sempre contou com acumulações energéticas por meio de nossas hidrelétricas. No entanto, muitas vezes elas estão distantes dos grandes centros de carga e, frequentemente, devido a efeitos climáticos, têm suas acumulações hídricas reduzidas, diminuindo seu grau de confiabilidade dentro da capacidade histórica plurianual dos reservatórios.

A questão é que a armazenagem cíclica anual foi sobrecarregada por um novo fenômeno: a ampliação da disponibilidade de fontes flutuantes de oferta ao longo do dia em nosso sistema interligado. A capacidade instalada de energia solar no país já supera impressionantes 40 GW e essa intermitência e inconstância geram um aspecto problemático conhecido como "curtailment".

Isso ocorre quando, durante um período do dia, é gerada uma quantidade de energia muito superior à capacidade de absorção pelo Sistema Interligado Nacional (SIN). Em uma simplificação, é como enfrentar o desafio de "levar o sol para a noite" e é aí que surgem os espaços para a armazenagem, uma ferramenta bastante útil para acelerar a transição energética.

O cenário brasileiro certamente apresenta esse desafio e a oportunidade já começa a ser enfrentada de maneira mais ostensiva por outros países.

Nesse horizonte promissor de armazenamento gravitacional de energia, a China está na vanguarda com um projeto recém comissionado nos arredores de Xangai, próximo a um parque eólico. Com capacidade de armazenagem de 100 MW, o sistema fornece 25 MW de eletricidade durante 4 horas. Essa inovação utiliza blocos móveis de cerca de 30 toneladas, derivados de um projeto parcialmente patenteado pela empresa suíço-americana Energy Vault, listada na NYSE.

Entre os aspectos positivos dessa solução disruptiva, destaca-se a menor dependência de insumos importados, como as baterias de lítio. Além disso, é um sistema "fabless", ou seja, não requer fábricas centralizadas, já que a produção dos blocos envolve obras de construção civil, fomentando empresas locais. Apenas os sistemas de controle, geradores e motores de ascensão gravitacional são importados.

Os projetos de armazenamento gravitacional devem, em breve, se expandir na própria China, com uma grande unidade de 2 GWh, prevista para o interior da Mongólia, e outros cinco projetos nas províncias de Hebei, Shanxi, Gansu, Jilin e Xinjiang, variando entre 100 MWh e 660 MWh, com unidades que podem alcançar 120 metros de altura.

O conceito de armazenamento gravitacional já desperta interesse em países como Austrália, EUA e África do Sul. No Brasil, os avanços ainda são incipientes, apesar do potencial para projetos-piloto utilizando as chamadas verbas de P&D. 

Dessa maneira, seria oportuno que o próximo leilão a ser definido pelo MME permita a participação de sistemas de armazenagem não limitados às baterias químicas, incluindo também as emergentes, como a gravitacional.

Essa abertura aumentaria significativamente a competitividade do processo, induzindo uma redução das tarifas ao consumidor final, sem representar riscos adicionais.

Tecnologias emergentes, como os sistemas de armazenamento gravitacional e as hidrelétricas reversíveis já demonstraram sua confiabilidade e eficiência em projetos ao redor do mundo. Esses sistemas são capazes de atender às necessidades elétricas com um tempo de resposta inferior a 3 segundos, desempenho superior ao das usinas termelétricas, que requerem horas para atingir a rampa de geração, com um significativo custo para isso.

Acredito que a inclusão de diferentes tecnologias de armazenamento nos leilões de energia seria um passo fundamental para modernizar a matriz energética brasileira, tornando-a mais competitiva, em favor dos consumidores. Essa abordagem estimularia a inovação, atrairia investimentos e contribuiria com novas tecnologias para ampliar a segurança energética do país, a longo prazo, e para o processo de transição energética.

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