Opinião

A lei paulista nº 17.293/20 e a indevida majoração do ICMS sobre o setor de óleo e gás

Conforme amplamente noticiado, o estado de São Paulo, em outubro de 2020, publicou a Lei nº 17.293 com o objetivo de estabelecer várias medidas para a realização de um “ajuste fiscal” que busque equilibrar as contas públicas.

Por Donovan Mazza Lessa

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Das inúmeras medidas, pode-se destacar, em especial, a delegação legislativa contida no art. 22 para que o Poder Executivo, a seu bel prazer, possa reduzir qualquer dos benefícios fiscais de ICMS existentes em, no mínimo, 10%, conforme previsão presente no Convênio nº 42/16.

Com base nessa questionável autorização que lhe foi concedida pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), o governador editou o Decreto nº 65.255/20 para reduzir o benefício fiscal previsto no art. 1º do Decreto nº 63.208/18, destinado ao setor de óleo e gás. Sendo mais específico, o Poder Executivo majorou a alíquota do ICMS (de 3% para 3,6%) incidente sobre a importação em caráter definitivo e sobre a aquisição no mercado interno de equipamentos utilizados pelas empresas paulistas nas atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural.

Essa alíquota de ICMS de 3% foi originalmente prevista no Convênio nº 03/18, o qual foi editado de comum acordo pelos estados para se definir um regime fiscal específico para o setor de óleo e gás até 31/12/2040, assim como fez a União por meio da Lei nº 13.586/17 (que criou os regimes do Repetro-Sped e do Repetro-Industrialização).

Para que as empresas pudessem se valer desse regime fiscal previsto no Convênio nº 03/18 – que está diretamente vinculado ao Repetro –, os estados impuseram uma série de condições onerosas, como, por exemplo, a desistência dos recursos administrativos e das ações judiciais em que se pleiteasse o reconhecimento da não incidência do ICMS sobre a importação de bens sem transferência da propriedade. Ou seja, os contribuintes precisam renunciar a direito reconhecido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 540.829 (o que, nas ações judiciais, ainda acarreta uma substancial condenação em honorários de sucumbência a favor da Fazenda Pública) para poderem utilizar os benefícios ali estabelecidos para o setor.

Ocorre que o Convênio nº 03/18, como visto, contém benefícios concedidos sob condições onerosas e a prazo certo, de modo que não podem ser modificados ou suprimidos a qualquer tempo, ainda que parcialmente, conforme determina o art. 178 do Código Tributário Nacional e o enunciado da Súmula nº 544/STF, que vão justamente ao encontro dos princípios da segurança jurídica e da proteção da legítima confiança do contribuinte.

Não se pode ter dúvidas de que a majoração de alíquota do ICMS realizada pelo Decreto nº 65.255/20 é uma violência contra as empresas de óleo e gás, pois representa verdadeira “rasteira” nos contribuintes que, para receberem o tratamento previsto no Convênio nº 03/18, tiveram que abrir mão de vultosos valores a que teriam direito em razão da insistência dos estados em cobrar débitos de ICMS sabidamente indevidos (ICMS na importação de bens sem transferência de propriedade). Além disso, fato é que, em um segmento que envolve investimentos de bilhões de dólares, qualquer alteração na carga tributária representa um impacto brutal no planejamento das empresas, sendo que medidas como a adotada pela Fazenda paulista apenas reforçam o receio que os investidores – especialmente estrangeiros – têm de efetuar projetos de longo prazo em nosso país.

Situação muito semelhante se verifica no estado do Rio de Janeiro, em que a Lei nº 8.645/19 determinou que os contribuintes recolhessem 10% dos valores de ICMS desonerados – em função de algum benefício – ao chamado Fundo Orçamentário Temporário (FOT), também criado para fins de equilibrar as contas públicas. No entanto, essa redução repentina dos benefícios fiscais, por meio da imposição do recolhimento ao referido fundo, também não poderia alcançar aqueles instituídos sob condição onerosa e a prazo certo, já tendo o próprio TJ/RJ, inclusive, proferido alguns acórdãos e decisões monocráticas nesse sentido.

Portanto, os contribuintes paulistas do setor de óleo e gás que se sentirem prejudicados devem acionar o Poder Judiciário para que possam evitar esse indevido aumento da carga tributária.

Donovan Mazza Lessa e Marcos Correia Piqueira Maia, sócios do escritório Maneira Advogados

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